5.4.21

Lobos à minha porta

Hoje eu acordei e decidi que ia me convencer de que não preciso mais de você, custe o que custar. 

Abri os olhos e abracei um gato. Não preciso da sua respiração umedecendo e aquecendo meus cabelos, e há de chegar em breve o dia em que minha cintura não se sentirá nua pela falta dos seus braços ao redor dela.

Dormir está cada dia menos difícil. Talvez chegue o dia em que eu não precise do amparo medicamentoso pra conseguir enfim deslizar para o mundo dos sonhos sem antes desaguar no travesseiro todas as lágrimas que ainda tenho dentro de mim, congeladas.

Fiz café. Coloquei eu mesma uma quantidade muito maior de canela do que deveria -- algum dia vou acertar aquele ponto exato que você coloca instintivamente, mas esse dia não será hoje. Aos poucos, eu aprendo a fazer as coisas do jeito que eu gosto, que você descobriu tão espontaneamente. Hoje consegui não olhar pra sua caneca no armário e, com isso, não senti as rachaduras se espalhando ainda mais veemente e inexoravelmente pelo meu peito.

Pé ante pé, pouco a pouco, as rachaduras vão cicatrizar.

Ontem, senti vontade de me machucar. Ontem, senti muita vontade de chorar, mas não consegui, e não houve filme, jogo, música, droga, que tirasse de mim essa vontade terrível de arranhar minhas faces até abrir um canal pelo qual as lágrimas pudessem fluir livremente.

Mas consegui resistir.

Um dia, pouco a pouco, eu vou conseguir me libertar de você.

E, quando esse dia chegar, vou rir de mim mesma e apreciar o quão ridícula fui por me apegar tanto a alguém que era pra ser só uma distração.

Mas por enquanto, e só por enquanto, vou escrever pra você palavras que você nunca vai ler. Até que eu esgote minhas palavras pra você. Até que eu consiga não mais sentir.