20.8.09

Renascer

Eu lembro de como costumava ficar encantada com a paisagem noturna da orla de Salvador. Recapturei essa memória admirando um coqueiro, esperando o ônibus para voltar do trabalho. Uma memória de quando eu não trabalhava, não estudava e não esquentava minha cabeça com nada. Uma memória de um tempo feliz, porque eu era feliz e nada iria mudar isso. Eu amava e era amada, eu era livre, eu ainda era eu. Tudo era novo e brilhante, e eu adorava caminhar pela praia em noites de lua cheia.

Não sei se foi a forma como a luz dos postes incidiu sobre o coqueiro ou a brisa que vinha do mar ou o quê. Só sei que hoje entendi que é preciso um momento mágico, uma epifania, para recuperar um amor que se julgava perdido. Com olhos doces, a cidade que tão bem me acolheu me fez perceber o quanto a amo, tanto quanto quando a vi pela primeira vez, apesar de todas as agruras e amarguras, de todos os momentos ruins que atravessamos juntas.

Hoje, declaro um recomeço. Este é o recomeço de nossa relação, cidade. Porque hoje você me reconquistou, e me fez sentir grata por você estar em minha vida. Hoje senti esse amor. Que seja eterno enquanto dure.

2.8.09

Cama de gato

As linhas de nossas vidas se entrelaçam e fazem padrões obscuros. Observando a forma como agimos, tenho certeza de que há alguma lógica envolvida, mas meu pensamento excessivamente terreno não me permite identificar qual é. Só percebo nossos caminhos se cruzando de novo, e chego a crer que gostamos disso. Gostamos da estranha sensação de segurança que saber que tornaremos a nos esbarrar nos passa. Era pra ser. Sempre foi pra ser. E seguirei acreditando que será novamente, algum dia, enquanto nossas vidas continuarem tão entranhadas uma na outra que é impossível definir onde começa a minha e onde termina a sua. Um dia, essa definição deixará de ser necessária, porque será uma linha nossa. Sem princípio, nem fim, apenas laços.

1.8.09

Nós e a noite

Com os olhos fechados, sinto o roçar de seus dedos delicados em meus cabelos desfeitos. Uma mecha displicente cai sobre meu rosto, e você não hesita em afastá-la, enquanto aproveita a oportunidade de acariciar levemente meu rosto. Seu perfume está mais que ao meu redor; fixou residência dentro de mim, aquecendo meu peito e me confortando no frio da noite.

Me permito me aconchegar junto ao seu corpo, nos embrulhando no edredom macio. Sinto seu calor às minhas costas e estremeço levemente quando seu braço me enlaça a cintura, a mão indo alojar-se sobre meu coração. É uma sensação boa, de proteção, saber que você estará ao meu lado e não me deixará atravessar as longas horas de escuridão sozinha no silêncio do quarto adormecido.

Desejo desesperadamente beijar seus lábios, mas é um luxo ao qual não me posso permitir assim, levianamente. É um temor tão grande de quebrar este feitiço que nos envolve que sei que tudo se acabará se eu me virar para olhar nos seus olhos. Há um buraco negro no meu coração, que suga para o vazio do esquecimento tudo o que dele se aproxima. Não quero correr o risco de me arrancar dos seus braços e arremessar você no olho do furacão.

Neste lugar tão nosso e só nosso, mantenho meus olhos firmemente fechados até que Morfeu dê o ar da graça e me leve a passear em seu reino. Só então me permito admitir que você está a quilômetros de mim. Esta noite, no entanto, pra sempre terá sido nossa, pois sei que você ficou comigo até o raiar do dia.

No meu travesseiro, nos lençóis, em mim: seu cheiro. Abri os olhos de bom humor, e desejei ao sol um bom dia.